Os espirais sobrepostos não fazem nada além de censurar o mais fino trago de uma palavra errante. Deixo passar, palavra por palavra, rompendo seus hímens. Quero apenas ser escrita.

Corre, corre, corre.
Muito rápido, para que nada se perca. Não quero que a essência se dissipe e saia andando por aí sozinha. Vejo os espirais, obras de minha arquitetura insone. Cortam palavra após palavra, pois estas parecem perdidas. Na verdade, há uma desconexão sutil e secreta. Falo de um oráculo. Então, um êxtase emerge no caos. O fluxo se faz perfeito. Partes de partes, sem conceito, sem ordem, apenas existindo. Não há começo, não há fim, não há zona limítrofe de espaço no tempo.

Falarei um pouco do tudo isto que me cria.
Engulo, arroto e pior, estou parindo palavras, um ciclo perfeito, mas raro e aturdido. Este relato é nada além de um sublimar de presente convicto de si.

Prefiro não perpetuar os fatos porque sou apenas eu, um personagem de meus personagens e que não posso dominar, ele brota e nasce. Sai do ar com toda sua abundância e se cria. Escrever é um dom que nos faz deuses. Há um mundo a ser construído, vida, morte, olfato e outras sinestesias a mais.

“Esta chovendo lá fora Após um beijo roubado, a menina corre. A chuva molha seus cabelos, seus pés descalços, seus medos. Ela tem os bicos dos seios rígidos, mas ignora a chuva, ela quer lavar seus pesadelos e o frio é melódico. O dia amanhece devagar. Qual será o seu nome? Ela passa pelas arvores, sinto-a ruborizada, não quer ir, mas também não quer ficar. Mas opta por correr, passa pelas árvores e se põe com o sol, atrás das nuvens. Xangô é seu padrinho e a chuva se desfaz.”

“Criança cai do colo de quem não a amamenta. A pobre coitada sabe que será a escória. Não por cair, mas por não ser. Seus olhos bóiam. Os peixes do aquário observam passivos. Não há mão que a segure, nem a liberte. Cadê você, Deus, neste momento? Jamais enxergará a tristeza dos homens. Não seria justo sermos todos felizes? Por que não somos dignos de tua piedade?”

Mata-se, cora-se, faz-se sentir o mofo das palavras.
Essa existência caótica me constrói.
Pisco os olhos e tudo muda, há um novo sopro no ar. Do riso à lágrima. Um instante novo para o já que já se foi. Era de verdade que havia uma lágrima. Frustrei o choro. A lágrima seca na face era cortante e duvidosa. Mas era. Não me prenderei ao passado, mas sim, ao devir do meu passado que me devolveu o agora.


No momento capto o amor.
Amor pleno, cultivado em terreno baldio. Amor fruto do porvir, porque aqui estou.
Amor,
Descobri em mim o poder de senti-lo.

Liberto-me do texto porque antes de ser escrita eu existo, em cada momento, em uma nova forma.

Escrevo para ti, apenas para ti, no banheiro, no meu quarto (não quero perder nenhum devaneio).
Existo, pois tu existes, porque existo. Não posso furar a película que me separa do sonho do qual não acordo. Descobri-me como teu companheiro e vou mais além porque sou homem e o meu coração pulsa no seu. Estou envolvido em uma cápsula de amor, rósea, perene. Ouço tuas palavras em divergência, mas a confirmação de que se trata a minha e a tua existência faz-se etérea e viva dentro de mim. Perdoe-me, mas não sei expressar de outra maneira e nem me preocupa cair no ridículo.

Sinto-te em mim. Será isto o inicio do amor?
Prefiro acreditar que sim, porque é inebriante senti-lo. Acordo e te acho nos meus cabelos. Afirmo você está aqui. Você está no meu cheiro, na minha pele e na minha dor de barriga. Enquanto você me habita não forjo um ataque contra mim mesmo, porque se o faço meu peito arde. Habite-me no já e perpetue enquanto puder, enquanto durar. Colei o medo na parede (fotografia do passado). Não serei castigado por falta ou excesso.

Acordo deste sonho e não me importa mais se não valer a pena.

Cesar Novais

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