Onde queres revólver sou coqueiro, onde queres dinheiro sou paixão.Onde queres descanso sou desejo, e onde sou só desejo, queres não. E onde não queres nada, nada falta, e onde voas bem alto, eu sou o chão, e onde pisas no chão minha alma salta, e ganha liberdade na amplidão. Onde queres família sou maluco, e onde queres romântico, burguês. Onde queres Leblon sou Pernambuco, e onde queres eunuco, garanhão. E onde queres o sim e o não, talvez, onde vês eu não vislumbro razão. Onde queres o lobo eu sou o irmão, e onde queres cowboy eu sou chinês. Ah, bruta flor do querer, bruta flor, bruta flor (...) Onde queres o ato eu sou o espírito, e onde queres ternura eu sou tesão. Onde queres o livre decassílabo, e onde buscas o anjo eu sou mulher. Onde queres prazer sou o que dói, e onde queres tortura, mansidão. Onde queres o lar, revolução, e onde queres bandido eu sou o herói. Eu queria querer-te e amar o amor, construirmos dulcíssima prisão e encontrar a mais justa adequação, tudo métrica e rima e nunca dor. Mas a vida é real e de viés, e vê só que cilada o amor me armou: E te quero e não queres como sou, não te quero e não queres como és. Onde queres comício, flipper vídeo, e onde queres romance, rock'n roll. Onde queres a lua eu sou o sol, onde a pura natura, o inceticídeo. E onde queres mistério eu sou a luz. Onde queres um canto, o mundo inteiro. Onde queres quaresma, fevereiro, e onde queres coqueiro eu sou obus. O quereres e o estares sempre a fim do que em mim é de mim tão desigual. Faz-me querer-te bem, querer-te mal. Bem a ti, mal ao quereres assim Infinitivamente pessoal. E eu querendo querer-te sem ter fim, e querendo te aprender o total do querer que há e do que não há em mim.
CAETANO VELOSO
O Quereres